Jacques Sapir, 12 de Fevereiro de 2015
Acordo no Donbass.
A reunião de Minsk
soldou-se por um acordo, embora frágil, mas que abre pela primeira
vez uma perspectiva de esperança para o povo do Donbass. Este acordo
deverá portanto, dar origem a um cessar-fogo que será aplicado no
domingo, 15 de Fevereiro às 00:00. É claro que grandes combates
podem ocorrer até essa data. No entanto, as condições políticas
marcam uma vitória significativa para os rebeldes, mas também -
mais subtilmente - para a Rússia.
Os termos do acordo.
O acordo prevê a
retirada de armas pesadas num raio de 50 a 150 km dependendo do
alcance e natureza dessas armas, a partir da actual linha de fogo
para as tropas de Kiev e da linha de cessar-fogo, do 19 de Setembro
de 2014 para os rebeldes. Isto só concerne as armas pesadas. Isso
significa que a verdadeira linha divisória será a actual linha de
fogo. Esta é uma vitória para os rebeldes. Organizando o recuo de
lançadores múltiplos de foguetes, este acordo irá impedir as
forças ucranianas de bombardear as áreas rebeldes, garantindo o
retorno à paz para a população de Donetsk, Lugansk e áreas
circundantes. Esta é uma segunda vitória para os rebeldes. Isto
será feito no prazo de 14 dias após o cessar-fogo, sob a supervisão
da OSCE.
Uma ampla amnistia
está prevista para todos os crimes e delitos cometidos em relação
com a situação e todos os presos deverão ser trocados (pontos 5 e
6). Forças estrangeiras, e mercenários devem abandonar o território
e ser desarmados sob a supervisão da OSCE (ponto 10).
Estão previstas
eleições em « conformidade com as leis da Ucrânia » nas regiões
insurgentes, mas o parlamento ucraniano (a Rada) deve votar dentro de
30 dias após a implementação do acordo um texto sobre o estatuto
especial destas regiões. A natureza exacta desse estatuto não é
especificada. Mas, está claro que vamos na direcção de um regime
de grande autonomia. Está especificado que uma nova Constituição
deve ser introduzida na Ucrânia antes do final de 2015 para
incorporar o princípio da descentralização como um elemento-chave
desta Constituição (pontos 9 e 11). As discussões devem ser feitas
com os representantes dos insurgentes. A « nota 1 » anexada ao
documento prevê entre outras :
. Direitos
linguísticos.
. Direitos das
autoridades locais de nomear designar os procuradores locais.
. Direito do governo
central para celebrar acordos específicos com estas regiões em
matéria de seu desenvolvimento sócio-cultural e económico.
. Reconhecimento
pelo governo central da cooperação transfronteiriça entre estas
regiões e a Rússia.
. Criação de uma
milícia dependente das autoridades destas regiões.
. A autoridade dos
eleitos não poderá ser questionada pelo parlamento ucraniano.
Uma vez as eleições
passadas e a nova Constituição votada (ponto 11), a autoridade do
governo será restaurada na fronteira com a Rússia. Este ponto pode
levar a graves confrontos com as autoridades dos rebeldes.
Globalmente, este
acordo acorda muito aos insurgentes, tudo em mantendo a aparência de
uma autoridade ucraniana em todo o território. Podemos pensar que,
se é aplicada e respeitada, conduzirá à criação de uma região
autónoma, com a sua própria polícia, suas próprias forças
armadas e uma relação especial com a Rússia. É um status próximo
da região autónoma do Curdistão, no Iraque.
As vantagens da Rússia.
A Rússia obteve que
a Ucrânia não entre na NATO nem na União Europeia. Que mais, no
texto preliminar ao acordo, ela obtém:
Eles asseguram igualmente as discussões trilaterais entre a UE, a Ucrânia e a Rússia para encontrar soluções prácticas ás preocupações levantadas pela Rússia no que diz respeito ao desenrolar do Acordo de Livre Comércio Completo e Aprofundado entre a Ucrânia e a UE.
Os dirigentes ficarão focados na perspectiva de um espaço humanitário e económico comum do Atlântico ao Pacifico fundado sobre o pleno respeito do Direito Internacional e os princípios da OSCE.
Este ponto é
importante. Volta-se a ter em conta as objecções da Rússia com o
acordo de livre comércio entre a Ucrânia e UE, e põe fim às
pretensões dos Estados Unidos « para isolar a Rússia ». A França
e a Alemanha se prontificam a reconstruir as infraestruturas dos
sistemas de pagamento, e a Ucrânia compromete-se a retomar o
pagamento das prestações sociais que foram suspensos para os
habitantes do Donbass. É incontestavelmente uma victória da Rússia.
A questão que resta
em suspenso é o de saber se este acordo será aplicado e respeitado.
Isso depende, em grande medida do que será a atitude dos Estados
Unidos. O fato de que estes não estiveram envolvidos no acordo lança
dúvidas sobre a sua vontade de alcançar uma paz duradoura na
Ucrânia. Este acordo é certamente imperfeito. Notoriamente frágil
em certos pontos e - a este respeito – na ausência de observadores
imparciais (se for a OSCE) o cessar-fogo é uma fonte de preocupação.
Mas ele existe, e isto é o essencial.
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